21.3.11

O leitor toma conhaque




Abriu a gaveta de tipos que habitamos
e imprimiu adiante as tolas palavras
de amor que eu lhe disse.

Publicados depois de mortos,
os versos não encontraram
outras para substituí-los.






14.3.11

A loja de roupas cansadas


A loja de roupas cansadas merece uma visita.
Faz parte da boa educação na vida adulta
mostrar aos filhos a precariedade da existência.

A fábrica de cimento, melhor deixar
para o dia em que se apaixonarem.



7.3.11

Pensa na saudade




Pensa na saudade
e as lembranças recuam, assustadas.

O algodão continua ali.
Doce. Desmanchando na boca.







5.3.11

A outra é escrever




Encontrou o pai chorando sozinho.
A ruazinha descia à esquerda,
abrindo uma picada na luz.
Sentou no banco da praça
e amarrou o sapato.
O pai sempre chorava de noite,
o que é uma forma de dizer
que não o compreendia.
A outra é escrever
coisas sem importância.
O pai lê e não entende.


1.3.11

A mala está pronta no quarto




A mala está pronta no quarto.

O presente não conjuga mais as paredes.

Há sempre uso para o que de tempos em tempos bate asas.

É como ser criança outra vez.

Amassado entre as meias de dormir,

coloquei-o no trem que levaria ao porto.