14.10.12

El enigma de la mamita



Veja como é pequena. Cabe numa só mão. 
Podes lançá-la com a outra e desalojar teu inimigo do seu refúgio. 
Ele poderá ficar vivo, morto, ou algo muito pior. 
Vivo, se for esperto. Morto, se tiver sorte. 
A granada parecia quente demais para segurar 
e meu pai entregou-a a mim 
minutos depois de tirá-la do bolso do casaco 
onde guardava também seus bilhetes do Sweepstake. 
Não era a primeira vez que me mostrava seus conhecimentos. 
Seus aperitivos visuais. 
Desde cedo me ensinou a entrar em casa sem ser percebido. 
Como aquele que não quis voltar. 
A falar com alguém sem ser ouvido. 
Mais tarde veio o sexo educativo com showgirls de sensações. 
Eu sou eu e a imaginação tortuosa de todos, 
ele me disse pelo telefone no dia seguinte. 
Ninguém precisa de livros. 
O que se aprende com papéis porosos e umas gotas de tinta? 
Não vejo papai com frequência. 
Ele mora no Quarto 23 de um hotel cem quilômetros distante de nossa casa. 
Um quarto que nunca visitei. 
Imagino tarântulas, pensamentos invisíveis, pistolas atômicas, 
um tabuleiro de mahjong para prever a posição dos corpos de seus inimigos. 
Quem sabe um irmão secreto. Uma cidade submarina. 
Um quadro de modelos vivos, Mamita e eu contra a parede. 
Ela não me conta do passado dos dois juntos. 
Por que papai tem oitenta anos e parece quarenta. 
Mamita fez quarenta ano passado e já usa dentes postiços de um protético francês. 
Penso em coisas sinistras. Maldições hereditárias. 
Não consigo evitar. 
Se eles são mesmo meus pais. 
Se este é mesmo o meu país. 
Se esta é a minha cidade. 
Se esta é a minha natureza. 
Frente a frente com o estojo de seringas, 
meus instintos primários me trazem calafrios. 
Não os sigo nem eles me orientam. 
Diferente do meu pai, não vejo engenhosidade 
nos caprichos da demonstração de força. 
Talvez eu seja uma pedra. 
Um banco de madeira onde todo mundo se senta para contar histórias. 
Talvez a casa de Mamita seja um laboratório e este laboratório, o meu lar. 
Papai, um detetive. Mamita, uma paranormal. 
Ele me prepara para a guerra. Ela, para o desconhecido. 
Coisas de um romance. 
Ou o próprio.