20.1.14

Tanta morfina




Ele sua a camisa para se promover. Comparece a tudo. Onde houver gente reunida online e off, lá está o dedinho dele. E ainda é paranoico. Aposto que se ler isto aqui, vai achar que é pra ele. Não é. É pro outro. Ou outra. Daqui de longe não vejo bem. Aquilo é um homem uma mulher ou um poeta? Um rato, corrija-se. A expressão conhecida é essa. Ando esquecido. Sempre andei esquecida, mas hoje até quando se esquece um prego no reto é Alzheimer. Tudo é Alzheimer. Será que ninguém entende que não há espaço numa cabeça para caber tanta gente, tantos números de ônibus, tanta morfina? Botar um piercing na buceta não é Alzheimer. É moda. Eu gostaria de ser um homem uma mulher um rato, mas tenho de ficar escrevendo isso aqui rápido e não há mais tempo. Daqui a pouco vou querer escrever outra coisa porque me canso de temas e personagens. Eu poderia escolher as opções texto preto e fundo preto. Nem eu saberia do que estava falando, como nas filas de cinema de shopping, numa palestra sobre os poderes implícitos da psiquiatria e das palmeiras imperiais no Segundo Reinado. Mas só que eu tenho um vizinho que é homem. Debaixo dele tem uma mulher, debaixo da mulher tem um rato, debaixo do rato tem um poeta. Daqui de longe não dá pra distinguir quem é quem. Além do Alzheimer, vão dizer que sou cego. Cega. Malditas desinências de gênero. O português é uma língua sexista. Sexo-segregacionista. Não fossem os poetas portugueses, não gostaria dessa língua. A palavra gênero já é escrota. Lembra supermercado, faculdades de letras. E o que é o Brasil? Grandalhão. Um brucutu de costas pro universo, marombando suas placas tectônicas. Esta cachaça esparramada no mapa. Você vive 100 anos e não conhece inteiro. Todas as cidades, ruas e buracos. Principalmente os buracos, a melhor parte de todas as coisas. De um corpo. De um livro. De uma casa. No buraco de um livro se conhece o autor. Você fica rastejando ali dentro para entender o que ele não está dizendo baixinho. Uma casa se finca num buraco maior infestado de buracos menores que a massa não cobriu. É ali nos buracos menores que alguém chora escondido, fala sozinho e se masturba. Isso. Masturbar-se. Acho que chega agora. Tenho outras coisas pra fazer. Com licença. Passe bem. E vossa mercê também.