16.5.11

A lareira finalmente ficou pronta




Daqui a trinta anos ou hoje mesmo recostará na poltrona diante do fogo e lembrará outra vez do dia em que ganhou a medalha de prata do torneio intercolegial de vôlei. O problema será evitar que os pardais construam ninhos no alto da chaminé. Não me agrada a ideia de sufocá-los enquanto aqueço os ossos com a mesma lenha que usarei para queimar minha antiga coleção de cartas encontradas na rua. Os velhos cartões-postais de amigos em viagem, fazendo de tudo para não se esquecerem disso. Caixas de fósforo do mundo. Palitos de todas as cores e formatos seguindo trechos do mapa. Uma fina camada de desonida no rosto. Ontem no metrô gritei inha e dois terços das senhoritas olharam para trás. É um velho truque que R. me ensinou quando não se consegue lembrar o nome de uma mulher. Parole morte. Não dizer muito. Dizer o que basta. Aula de métrica, primeiro semestre do segundo ano. Para controlar a sobrecarga de expressão da juventude. Quando a palavra é pouca, leia-se por dentro. Tirando a casca com a delicadeza tímida dos violentos, para que não se rumine além do necessário. Não precisa ir muito longe. E o amor é sempre uma boa desculpa para ficar. Enquanto atiça o fogo, outras línguas morrem junto com os pardais.