27.12.11

Eu quero o pano de chão que estava aqui


Eu quero o pano de chão que estava aqui. Onde está o pano de chão que deixei aqui? Eu comprei dois e um estava bem aqui.  É este um que eu quero. Você não precisa refletir muito para  compreender que eu quero o pano de chão que deixei aqui. Se deixei aqui, ele devia estar aqui. Constantemente presente. Com sua razão de ser.  Eu não quero o pano. Eu não quero o chão. Quero o pano de chão. Uma síntese indissolúvel. Não são palavras criadas por mim. São um objeto. Que está faltando. Isso significa uma espera. Eu espero o pano de chão que estava aqui num outro momento e neste exato não está mais. E quanto mais espero mais a minha mão pesa na caneta. A ausência é sentida e pesada. O mundo dos meus objetos não é mais o mesmo.  Falta um ponto no mapa. Ou um traço.  Falta um lago, uma ruazinha, uma cidade. E se falta, há um buraco. Alguém pode cair nele. Eu poderia dar pela falta de uma árvore, um poste. Um cacho de uva. Uma emoção antiga dita de uma maneira nova. Mas é do pano de chão o rosto na gravura. No primeiro momento de descuido esse rosto disfarçará a voz e não parecerá mais o que é.  Isso é o mais longe que ele poderá ir.  Quanto mais dou por sua falta, mais jogo o resto que me cerca fora.  E por jogar o resto fora, ele se agiganta.  Calcule por hectare.  E ele só começou com uma frase. Eu quero o pano de chão que estava aqui foi onde tudo começou e agora não consigo alcançá-lo. A distância só faz aumentar, o que é um perigo. Se é um perigo, posso querer negar.  Não, o pano de chão não estava aqui.  Você tem certeza de que estava aqui?  Tem certeza de que você tinha um pano de chão?  Quem se importa com o teu pano de chão?  De que serve?  Mas eu não preciso me explicar com uma palavra, muito menos com três. Muito menos negar.  Negar é fugir. Agora eu posso entender o que é uma emoção. Eu quero verdadeiramente o pano de chão que estava aqui.  Arrumo minhas urgências na ordem que eu quero.  Dentro do sol quente da manhã.