1.5.13

E.din




Foi assim, mas para os meus olhos, não. 
Para os meus olhos foi amor à primeira vista. 
Depois aconteceu o dinheiro. 
Tudo que aconteceu foi o dinheiro. 
Pairando nas duas faces das águas: 
imagem e semelhança. 
Um rio informe correndo em abril. 
O número errado do telefone 
que o bêbado disca sem parar antes de dormir. 
Num certo sentido eu era o bêbado. 
No outro, a triste história repetida a garçons invisíveis. 
No começo não contei a ninguém. 
Estava lá o tempo todo e eu olhava 
os bancos, os tapetes, 
a quina das paredes, 
alheia a sua presença hiperboloide
costurada em tudo que havia comprado. 
Eu devia ter adivinhado que 
um pouco mais à frente
já estava comigo 
há muito tempo 
a sua ausência. 
Ele salva a minha vida, 
e larga a porta me deixando para trás. 
Eu continuo buscando, 
ninguém larga um grande amor. 
A porta é de vaivém. 
E assim se fez. 
Não sou a única. 
Não é bom que estejamos sós. 
Sei que não és apenas meu. 
O seu encanto está em dividir-se 
em prazer nas guerras que provoca por sua atenção. 
Nos corpos que se debatem 
sem que ele erga o olhar uma só vez. 
Não matarás ninguém para ficar com ele, 
talvez seja por isso que me veja tão pouco. 
Que economize nos carinhos. 
Que esprema as palavras 
para que lhe devolvam uma só língua. 
Meus pais nem os gansos precisaram 
me avisar de que um dia aconteceria. 
A vida é cerâmica saída do forno. 
Aos poucos eu ia compreendendo 
o leve som do seu movimento à nossa volta. 
O azul, o amarelo, o verde. 
E por que tantas brigas, 
tantas reconciliações, 
os cálices de vinho tinto nas celebrações. 
A cerimônia do chá nas cidades ao lado. 
As famílias. 
Lavrar e guardar. 
A união como quem veste uma roupa. 
O sorriso e a lamentação. 
Quem oferecia o sangue, 
quem oferecia o nanquim. 
Cada rosto emitido por ele. 
Cada passo trilhado até ele 
por ruas com nomes de sentimentos. 
Uma massa de arroz empapado. 
Sua voz meticulosamente metálica 
talhando ali o pensamento. Uma verruga 
que cruza os mares estocando-os em celeiros. 
Rebatendo almas num campo pesado 
para ganhar mais bases. 
Depois de cada partida, 
ele nunca está bêbado. 
Renovado, aproxima-se de mim 
e coloca uma música suave na máquina 
para ouvirmos em casa. Cansada -- eu o beijarei 
até que a última nota escorra pelo mármore.