30.12.14

O primeiro amor





Anotei seu nome e telefone 

no verso de uma bula de Broncocilin.






20.12.14

No meio do Caminha




Sonhei que vomitava faeces

Nunca me esquecerei desse acontecimento


Na vida de minhas papilas tão foliadas





11.12.14

uma coisa pra lembrar





o bom de sair não é ver gente
é ver os prédios novos
prédios antigos
portarias de mosaicos
varandas balaústres
muralhas de vidro
farmácias abertas
pisos escorregadios
tomar um mate gelado
fumar escondido nas garagens
acompanhar o meio-fio
fachadas de pastilhas azuis
comprar chocolates
às vezes eu quero voltar
ver bicicletas na vitrine
nuvens carregadas
um comboio de maritacas
papéis voando no chão
namorar produtos de limpeza
pianos de demolição
fazer amizade com cães vadios
entrar num banheiro público vazio
lavar o rosto e sair pingando
ler cartazes nos postes
o preço do prato do dia
esperar a noite descer
chamar o elevador
e dar num andar qualquer
sentar nas escadas
entre o clínico geral e o dermatologista
apertar a bolsa contra o peito
passar por uma churrascaria deserta
um salão de cabeleireiro
ouvir as rodas chiando no asfalto
ouvir cores de vozes estranhas
vermelho amarelo verde
esperar a noite ficar
uma coisa pra lembrar
e voltar por outro caminho
o bom de sair tem gosto de quarto de hotel
mergulhado na escuridão
tem gosto de bombom adormecido 
na mesinha pra te acompanhar




beijo molhado de sangue


Numa encarnação passada, me imagino trôpega,
apoiando-me nestas paredes da Villa Conti de 1860, 

tossindo sangue como uma tuberculosa. 

Pensando em alguém como na dor. 

Ou em ninguém, 

só no sangue a manchar o meu vestido. 

Olhando para o céu, 

à procura de um deus,

de uma cura,

de uma roupa limpa, 

e me engasgando com mais uma golfada.

Talvez haja um baile acontecendo na casa ali em frente.

Uma casa coberta de limo.

Com sorrisos cobertos de limo

aos quais eu acrescentaria um beijo na face.

Um beijo molhado de sangue.

Talvez a casa esteja abandonada

e eu não pertença mais a este século.

Nem a nenhum outro.

A fotografia não me alcançou.

Fotografias não me alcançam.

Em algum lugar do meu rosto

há um lenço manchado de sangue

que eu nunca encontro.