13.11.15

A galinha morta de Borremans






Quem só fala de primaveras e orvalhos me odeia.
Devo ter cara de lama tóxica.
Da galinha morta de Borremans.
De burguesas sem viço e sem métrica.
De verbos vindo à tona em lixões a céu aberto.
De quem traz o revólver na cintura.
E no entanto sou tão linda.
Uma coisa vaga.
O batom na pia do banheiro.
O copinho de cachaça por trás de janelas fechadas.
O sol de Pilatos.
A ânsia de vômito de Pushkin.
A raça secreta das meninas de família,
dos governadores de estado.
Um terraço cheio de plantas voluntariosas.
Não precisam de primaveras ou orvalhos.
Barbantes filosofantes --
minha poesia causa câncer.
E trabalho com muito entusiasmo
quando a noite começa a jorrar.