10.2.19

Um edifício na praia





Um edifício na praia. Não na beira. Um edifício na areia. Uma longa extensão de areia batida e clara. Um edifício mais largo do que alto, sobre pilotis. Como um bloco abandonado de um conjunto habitacional abortado. Um edifício branco de janelas azuis. Branco e azuis descascados. Passeio entre os pilotis sem plano definido. Não há nada, ninguém, nem entrada, escada, elevador ou garagem. Só espaço, amplo espaço livre de uma coluna a outra. A areia fresca alivia meus pés. Me sinto bem ali onde o mar não se avista ainda, mas manda o seu vento na frente como um batedor. As janelas fechadas. Umas tantas abertas, olhos vazados por onde nem uma alma se esvai. Não há como subir até os apartamentos. Pouco importa. O prazer é sentar na areia e ver de longe. Andar devagar até ele e voltar. Contorná-lo. Olhar. Respirar seu cheiro. Maresia sem mar. Branco e azul. Branco sem nuvem, azul sem céu. Não me vejo com ninguém ali, mas posso pensar em você se você chega perto. Daí me levanto e ando de novo até os próximos pilotis, onde pensarei outra coisa, outro dia. Eu poderia zelar por isso aqui, mas o prédio não precisa de ninguém. Não mandou me chamar. Se me cansar dos pilotis, talvez eu escale a parede até o primeiro andar e entre por uma janela aberta quando ela anoitece. É de uma janela que tudo acontece. O mar pode estar mais próximo amanhã. Apago a vela no gargalo e espero.