6.3.15

Hotel Casablanca, 6 de março




Estou ficando farta de ver caras vintage, rabos vintage, arte vintage, periquitos vintage, hollywoodidades, bizarrices vintage — bondage vintage. Poderia haver aqui umas gotas de nostalgia do futuro. Estou cansada do meu neurônio vintage, esta condutibilidade ao passado vivido e não vivido. Vontade de explodir este blog com uma granada da Crimeia. Por que ser diferente? Se é que havia granada na Crimeia de Todas as Crimeias. Eu já sei mil vezes que seu pai era russo e inteligentíssimo. Que seus ex-maridos foram torturados. Você fala isso sempre com aquela expressão de primeira vez. De grande segredo. Até o marceneiro da rua sabe. Você não viu, mas a história da sua vida ele reduz com uma serra tico-tico sem deixar uma rebarba. Procure quem não sabe. Nas suas fotos em sépia de famílias vintage alheias deve haver alguém. Hoje não é um dia bom. Ontem foi pior. Quando se dorme com um choro engasgado, um choro indeciso entre a traqueia e o esôfago. Tudo que eu quero é aprender a fazer um khachapuri bem gostoso pra você, nem mais nem menos. Mas se você me diz que gosto mais das coisas do que de você, eu quebro ou rasgo o que for para provar que não. Dramático, hum? Magnanesco. Ontem rasguei 2 livros meus — antigos, de poetas antigos mortos antigamente — num momento de alta tensão. Não me arrependo pelos livros. São coisas, posso quebrá-las. São minhas veias, posso rompê-las. Já o cansaço. O cansaço de tudo vem a miúdo. Disfarçado ou à paisana. Fica no canto do quarto me olhando por trás do jornal aberto. Não conheço seu rosto. Um chapéu cobre os olhos. Não poderia ser diferente. O cansaço é um detetive noir.