27.8.18

Berna







Ela escreve à amiga: 
“Ainda não encontrei a mulher da minha vida.” 
Uma frase depois leio que se refere a uma empregada doméstica, à dificuldade de achar uma criada “nossa”, uma multisserviçal vitalícia para ela, autora, o marido e a prole em formação. Imagino-a escrevendo isso ao lado de rosas de cobre e sua outra mão velociraptora segurando um pãozinho tremente e dulcíssimo com o dedo mínimo marfim erguido, o café esfriando na varanda ventilada em Berna. Sinto um espasmo estomacal de repulsa. Sinto-a abrindo a boca para morder e despencando de cabeça na mesa de mármore. O jornal da manhã intocado em seu colo. Infarto fulminante. Tomo um gole de água pura, ajeito o lençol e durmo tranquila no seu terceiro e melhor romance.