30.11.12

O corpo



Viro a cabeça & vejo os trilhos. Vermelhos
-- ebulindo no azul aeroplano
uma pequena poça sem ventos.
Olho bem para eles -- Não dirija à noite.
Uma voz de lado.
Do outro, algum tempo ainda.
Na mão contrária, o bilhete da cozinha:
a vida vai ficar pronta num minuto.
Sente & espere.
As janelas acesas.
A garrafa no balde de gelo.
No fundo do copo um banho quente.
A que horas você volta?
Liguei o carro e meu nome foi embora.
Nosso abraço saindo da cidade.
Os trilhos continuam pelo falar:
não se mexa enquanto estiver diluindo.
Onde bate água tem de escurecer.
Acho que chegarei bem em casa.
Meu amor.









24.11.12

Puro algodão




Eu estava com insônia e dali a algumas horas teria um dia muito ocupado. Martelar isso não me ajudaria a dormir. A cama e o colchão foram comprados a longo prazo e o dia ocupado à frente tinha algo a ver com isso. Pensei um minuto. São 3:10 da manhã e se não demorar muito talvez eu possa dormir se não pensar muito em demorar a dormir. Não pensar muito não é o meu estilo, o que também pode demorar. Comprei o lençol errado. Certo porque tem listras azuis e brancas, mas alta concentração de poliéster. Sigo as listras ora pelo azul, ora pelo branco, entrando no azul, dobrando até o branco e saindo no azul novamente. Paro no caminho para beber água. Sento numa pedra. Se aqui faz sol é porque do outro lado do mundo faz lua. Posso esperar quando o que espero é o esperado. Apanho um punhado de areia. Regulo a velocidade de saída dos grãos dentro do meu punho fechado. Por meus dedos duas horas escorrem em dois segundos. Um barco a remo passa na listra seguinte. Alguém me acena de lá e engulo uma fatia do meu bolo de aniversário de quinze anos. 
Naquele tempo os lençóis eram puro algodão.

  


17.11.12

Quando não se quer dizer nada



Não tenho medo de tudo
Assim, só de barata
Aqui em casa não tem barata
Então é como se não tivesse
medo de nada, nada de nada
Passa esse chocolate
Mas, sabe o que é?
Tenho medo dele
Daquele rapaz de cachinhos
Ele é uma esponja
Se eu espirro, 
ele espirra
Se troco as calcinhas,
ele troca as cuecas
Se cumprimento alguém,
ele põe o mãozão na frente
e aperta tanto que o alguém
fica com a mão dele 
e esquece da minha
Eu tenho medo de esponja
De gente esponja
Tudo que eu falo 
parece que foi ele que falou
Tudo que eu escrevo 
ele escreve mudando as palavras 
no que fica a mesma coisa
Melancia à vontade
O dia em que ele se alojar
na minha fossa ileocecal,
ninguém salva
hum, o chocolate tá booom
como sabia que eu gosto com castanha?
Só minha mãe sabia
e ela virou areia na praia da Urca.
Um chocolate é uma coisa tão simples
Não desaparece nem quando se apaga a luz
E se a gente parecesse as únicas pessoas aqui?





16.11.12

Aprendi com Baudelaire



























(em Não feche seus olhos esta noite, Ed. Rocco)


12.11.12

Unha festa no xardín


Non podería haber día máis perfecto para unha festa no xardín.

A lua cheia sem uma nuvem.

Nosso barco se aproximando de Tipasa.

Vai explodir em 15’ 14”.

Daí ela cinge o futuro às amígdalas.

Como extirpá-lo de vez?

Ela não quer a minha morte, acha que não preciso morrer porque de certa forma já estou morto. Mas sou capaz de farejar sua fome. A maldição sob os pensamentos mais leves. Esse fogo subterrâneo da, não, não me pergunto a idade. Para mim tudo tem seis meses, o dia em que a conheci. Sem tempo. Sem amigos. Sem respostas -- todas já nos viraram as costas. Andamos juntos os dois. Faço o que ela pede, manda ou roga. Não expresso condições, ou ajusto parágrafos mentais. Inútil dizer por quê. O boi avança cego para o matadouro. Ou para as estrelas. Um dia começa a cantar.