4.12.17

Je m'en fiche de tout





Não sei se você se lembra daquele dia em que saímos com bandini e maria. fomos ver raw deal no cinema e jantamos no de gausse. uma noite única não só porque quase me sufoquei de tanto rir com as duas, mas porque estávamos felizes outra vez juntas eu e você depois do voo de seis horas que tive de enfrentar para encontrá-la. não sei se lembra. já são mais de quinze anos. o tecido da memória se esgarça. corrompe histórias vividas. embaralha. redistribui. nunca mais nos vimos. não vi você – seu apartamento – sua cama – seu corpo vitoriano – sua tela Je m'en fiche de tout – as chaminés dos terraços vizinhos – as linguagens de superfície. você se preparava para viajar ao senegal a trabalho. joguei a mochila no sofá e nos beijamos ao lado de peixes apáticos. elogiei sua bicicleta nova. a capa do keats sobre a mesa. o sabor do campo viejo. os sobretudos abotoados não poderiam durar muito. e mais uma vez não gozei com você. deixei-a só. incorporal. talvez você ainda esteja no senegal enquanto tomo esta xícara de café e vejo pela janela o vapor que se ergue dos pântanos sob a ponte. talvez agora seus caminhos de fuga usem tintas mais ásperas. trincheiras. barricadas. foi um tanto abrupta a despedida. uma música alta e mulheres dançando no salão. os carabinieri nas ruas. eu meio intoxicada de um jeito ou de outro. o seu olhar aion. pegou-me pela mão, cruzamos uma arcada, entramos num pátio, tocou meu rosto e envolveu-o com um adeus. um adeus que hoje pela manhã saiu por detrás dos arbustos e me trouxe seu nome na explosão final de um êxtase. não sei se poderei lembrar mais do que isso.