28.1.14

Cabeças humanas decassilábicas




De longe avisto aquela 
cabeça humana decassilábica 
sei que é Domingos descendo a rua 
até minha porta. 
Deve ter passado noites chupando veias 
poéticas de gregos e latinos. 
Domingos quer imitar poetas arcadianos 
sem perder seu gibão moderno. 
Sem tirar a mão do tempo. 
Acha que poderá se trocar palavras, rimas, matérias. 
Está num devir neopombalino, 
para galanteio dos Amigos, 
exatamente o que acho de 
cabeças humanas decassilábicas 
sem poder dizê-lo. 
O instruir e deleitar horaciano 
combina bem com a redondilha perfeita 
do pescoço do meu 
Cavalo. 
Vou até o curral e preparo a montaria. 
Domingos e eu combinamos esticar 
a licença de El Paso até o Parnaso. 
Uma jornada para dar vazão a pensamentos 
brancos sem musicalidade, assim disse ele. 
Creio que vamos demorar nessa fatura, 
hoje estou muito emotiva, 
duvido que possa conter 
minhas consoantes/toantes 
em círculos, quadrados, triângulos. 
Escolho o terceiro buraco da fivela da barrigueira, 
faço os últimos ajustes no peitoral, 
na embocadura. 
Domingos cruza a porteira, aproxima sua 
cabeça humana decassilábica 
de mim. 
A cabeça sorri, 
o tom em vez do som. 
É isto que chamam de estro. 
Deixo dois dedos de folga na focinheira.