1.7.18

L'hora grisa




Querido maço vazio
Não sei se te amasso, jogo longe e converto, 
ou desenredo em pedaços e enterro. 
Posso fazer uma bolinha. Brincar de futebol com meu gato. 
Ele até gosta. Lagartixas nem conversam mais.
Maço querido e oneroso, quantas horas/dias de vida me roubaste? 
E entregaste a quem? Já de nada te servem se estás acabado, bocó. 
Fiz uma poesia fumando teus filhos. 
Ouvi um Mompou inteiro queimando os miúdos um por um. 
Não é culpa minha. É o vento que arrasta.
Pensei muitas coisas durante essa névoa enferma e paterna. 
Olhava pela janela e os expulsava pela boca, 
como da sala a professora cansada para quem 
as crianças são velhas e não lhe fazem mais rir. 
Depois. 
Depois uma coisa. 
Acendi um errado pela cabeça. 
Ele gritou, ah se gritou. Tirou-me o sono. 
A saia engomada.

Amanhã estarei na venda. Renovado, me receberás — 
Sentaremos no pequeno balcão um junto do outro.
Apertados.
Sufocados. 
Amantes. 
Capa e miolo.