A sra. Escovedo não acha mais papel carbono
nas duas papelarias de sua cidade.
Ela só precisa das papelarias e da cidade
porque precisa do papel carbono.
A sra. Escovedo é Rosita.
Ninguém chama de Rosita a bisneta
do ex-governador geral sem pagar nada.
A sra. Escovedo também não saía de graça.
Tinha medo dos objetos.
Toda segunda-feira o senhor cura abençoava portas,
fechaduras, baús, roupa de cama, panelas, xícaras de chá.
E o missal, intocado.
Além dos doze poodles,
únicos seres vivos de quem dependia e
com quem conversava por temê-los.
A sra. Escovedo gostava de ler mas não gostava de livros.
Nos livros nunca sabia onde entrava a mentira
e por onde saía a verdade.
Por isso, quando queria ler, ela mesma escrevia e se lia.
Sem costuras, de alto a baixo.
Nos livros havia gente demais.
Quando ela mesma escrevia, aquela gente toda ia embora.
E ficava o silêncio. Como uma graça alcançada.
Tanto odiava livros que sua memória não os retinha.
O que lia por sua própria caligrafia não esquecia.
Desenhava as letras com esmero.
O carbono entre as duas folhas.
Uma para ela, outra para Rosita.
A sra. Escovedo tinha preferência por letras com pernas.
Falava de jejuns e vigílias.
Dos fantasmas que amedrontam crianças que choram.
De joelhos dobrados e mãos postas.
Do martírio.
Tudo verdade sem vírgulas.
Rosita preferia os poemas.
Que falassem da Lua Nova, do mar e suas vontades.
Muito mais do que das flores, que falassem de bananas fritas.
A sra. Escovedo se ria de Rosita, sua cabra-cega.
A hóstia presa na âmbula.
De olhos vendados e poesia,
Rosita jamais conseguiria pegá-la.
Assentavam bem melhor nela do que em mim.