Subindo para o Vale, troco as marchas de ouvido.
Vale das Videiras.
Hoje não há mais videiras por lá.
A neblina saindo de trás dos morros
dissolve o para-brisa.
Nunca houve.
No quarto escuro respiro o vapor frio.
A Igreja do Carmo.
De fora para dentro.
De dentro para fora
talvez ficasse melhor.
Não levo ninguém comigo.
Só a duração da espera.
Das minhas roupas que adoecem.
Eu não me canso de olhar o carro subindo
as curvas sinuosas do Vale onde não penso.
As mãos suadas virando o volante
num silêncio de lápis de cor.
Ele não vai pedir anestesia,
ainda que o coração publique se o fizesse bonito.
Vai travar o ferrolho e esquecer da vida.
Nem bem raiva, nem bem poesia.
Antes eu não pedia, não há mais videiras por lá.
Só nós dois na rede. Mas a morte também.
Balançando nos fios soltos.
Uma voz ao piano, feita para aquela emergência.
O motor ronca entre árvores e morcegos.
Os novilhos estão dormindo
porque não escrevi uma linha.
Ele deita sangue pela boca e pego mais um lenço limpo.
Um clarão no retrovisor.
Deito ao seu lado e acompanho sua respiração,
trocando as marchas de ouvido.